Em razão de compromissos assumidos no âmbito internacional, conforme artigo publicado anteriormente (leia aqui), a recém publicada Lei nº 14.651/2023 alterou significativamente a aplicação e o julgamento de certas penalidades aduaneiras, como é o caso do perdimento de mercadorias e veículos (Decreto-lei nº 1.455/1976), do perdimento de moeda (Lei nº 14.286/2021) e da multa ao transportador de mercadoria sujeita à aplicação da pena de perdimento (Lei nº 10.833/2003).
A lei delegou ao Ministro da Fazenda a competência para regulamentar o rito administrativo de aplicação das sanções e as competências de julgamento, que redundou na publicação da Portaria Normativa MF nº 1005/2023, na qual foi criado o Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras – CEJUL e estabelecidas normas processuais para a solução dos litígios envolvendo as matérias que lhe são próprias.
Por fim, o Secretário Especial da Receita Federal do Brasil, por expressa delegação do Ministro da Fazenda, expediu a Portaria RFB nº 348/2023, publicada em 04/09/2023, que concluiu a regulamentação do tema e disciplinou o funcionamento do CEJUL.
Foram muitas novidades trazidas nos últimos dias e faremos um breve resumo de como funcionará e o que muda para os operadores do comércio exterior.
A partir do dia 24/08/2023, a pena de perdimento passa a ser aplicada pelo Auditor-Fiscal que preside o procedimento fiscal de apuração das infrações, competência que antes era do Delegado da Receita Federal. Esta pequena mudança alterou completamente o andamento das etapas do processo de perdimento.
Com efeito, a linha do tempo foi deslocada, passando a aplicação da pena de perdimento a ocorrer simultaneamente à lavratura do auto de infração, enquanto anteriormente esse momento se dava apenas quando da apreciação da impugnação pelo Delegado da Receita Federal.
A destinação das mercadorias só será permitida, regra geral, após o julgamento do recurso de primeira instância, ou da revelia. Essa medida é fundamental para evitar que os estoques de mercadorias se avolumem e que haja o perecimento do bem e/ou o aumento nos custos de armazenamento. Caso haja reforma da decisão pela segunda instância, o proprietário da mercadoria será indenizado (Portaria Normativa MF nº 1.005/2023, art. 36).
A criação do Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras – CEJUL afastou definitivamente o aplicador da penalidade do julgador dos recursos apresentados, pois a nova estrutura de julgamento passa a ser nacional, virtual e fora da competência das autoridades aduaneiras, ficando vinculada à Subsecretaria de Tributação e Contencioso – SUTRI (art. 3º, Portaria RFB nº 348/2023).
Outra medida garantidora da independência dos julgadores foi o estabelecimento de mandato para o exercício da função (Portaria RFB nº 348/2023, art. 9º, I), impossibilitando o afastamento das autoridades julgadoras por qualquer outra razão senão aquelas elencadas na própria norma administrativa (Portaria RFB nº 348/2023, art. 10).
A estrutura do CEJUL contará com julgadores de 1ª instância recursal, que comporão a Equipe Nacional de Julgamento (ENAJ), cujas decisões serão monocráticas, e duas Câmaras Recursais para apreciação dos recursos direcionados à segunda instância, compostas por, no mínimo, três julgadores cada uma, com decisão colegiada.
Outra novidade muito importante é a possibilidade de sustentação oral em segunda instância por parte dos interessados (Portaria RFB nº348/2023, art. 18), que possibilitará melhor explanação da tese contida no recurso voluntário, colaborando para a ampliação do direito de defesa.
Importante destacar que todos os processos em andamento, cujos autos de infração tenham sido iniciados antes da entrada em vigor da Lei nº 14.651/2023, e cuja pena de perdimento não tenha sido aplicada até aquela data, estão alcançados pela regra de transição, podendo ser apresentado recurso ao CEJUL após a ciência da aplicação da penalidade (Lei nº 14.651/2023, art. 4º).
Serão disponibilizadas no endereço eletrônico da Receita Federal na internet as ementas de todos os processos decididos pelas Câmaras Recursais (Portaria Normativa MF nº 1.005/2023, art. 39), o que permitirá maior transparência na atuação dos seus julgadores, além de possibilitar a criação de uma jurisprudência administrativa aplicável aos processos submetidos ao CEJUL.
Em suma, tão logo o CEJUL esteja atuando formalmente, novas informações serão publicadas, a fim de que a comunidade do comércio exterior possa estar devidamente informada sobre as novidades deste importante tribunal administrativo.